Nada no genótipo humano pode ser especificamente marcado para que alguém jogue basquete, fale inglês, componha músicas,tenha casos extraconjugais ou se torne médico ou psicológico. Todas essas formas de expressão são produtos da invenção cultural humana, desenvolvidas milhares de anos depois que o genoma humano foi estabelecido pelas pressões de sobrevivência dos tempos. Mesmo assim, quando o ser humano passa a possuir nome,raça, identidade nacional, família e mesmo a capacidade de reagir a um chamado, muita coisa fica assentada e deixar de ser acidente ou escolha arbitrária. Na verdade ,o self e muito da personalidade de uma pessoa parecem_e em sentido psicológico realmente são _essenciais.
No sentido biológico e depois em sentido psicológico, grande parte do que começa como arbitrário torna-se essencial. Na reprodução humana, existem bilhões de combinações possíveis entre determinados espermatozóides e determinados óvulos quando se trata de parceiros sexuais, e claro que outros bilhões de possibilidades, somente algumas concepções ocorrem. Mas, quando a concepção ocorre_devemos dizer que de maneira arbitrária ou casual, dado o enorme número de possibilidades nulas_,o genótipo daquele indivíduo se estabelece em sua essência .
Coisas arbitrárias continuam a acontecer também depois do nascimento. Um nome é escolhido _talvez de um livro de nomes com milhares de nomes. Por inspeção, é atribuído um gênero à jovem criatura e, atribuição, uma identidade racial,nacional,ética e religiosa. Visto da perspectiva dos tempos, tudo isso é bastante arbitrário _o produto de miríade de sucessivos acasos.
E , no entanto, quando olhamos no espelho não vemos um acaso. Vemos e sentimos a essência. Somos donos de nosso nome é de nosso rosto, nossa família e mesmo de nosso lugar no mundo _seja ele nobre ou humilde _como elemento essenciais de nosso ser. Esses são os pontos iniciais do que desempenhamos no mundo e somos transformados pelas circunstâncias. Temos uma relutância geral em mudar nossas características essenciais ou admitir erros na forma como nos chamam, aceitam e reconhecem. Ou negamos ou esquecemos que tudo é tão improvável, tão inverossímil, tão desnecessário, tão arbitrário.
Os palcos nos quais somos jogados também têm algo de indispensável. Os meninos do campo acham que a terra é a sua alma. Os sofisticados urbanos em sua maioria não gostam de fazenda. O arbitrário torna essencial.
Essa formulação parece particularmente útil quando se pensa em religião. Qualquer pessoa que reflita, a partir de uma perspectiva desinteressada, sobre a pletora de religiões no mundo terá uma árdua tarefa para justificar a tradição da própria religião como a única correta. Como diz Mark Twain : "A facilidade com que considero a religião de meu vizinho sugere-me que a minha própria também é falsa". E no entanto, somos o que somos_arbitrariamente, claro, mas também essencialmente : cristão, judeus,hindus,muçulmanos,budista, etc...
A religião, em si, não é somente uma peça arbitrária de teatro, apesar de, com certeza, tratar-se de teatro. É aquela forma de teatro especificamente desenvolvida para nos ajudar a lidar com os momentos de crise mais difíceis do drama humano; nascimento, casamento e morte. Entre tanto ,a religião nos fornece histórias sacras_ ficções sacras,que quiserem _que são instrutivas sobre assuntos como bênçãos, obrigações morais e como lidar com medos existenciais. A estrutura mitológica completa que nos é fornecida através da religião é maravilhosamente instrutiva. Estudar a história da religião ou procurar pelo Jesus histórico é forçado a reconhecer que nossa tradição particular é bastante arbitrária _que as coisas poderiam ter saído bem diferentes. Mas,se lembrarmos que aquilo que uma vez foi colocado como arbitrário pode e realmente torna-se uma característica essencial de quem somos ,então é possível aceitar as verdades místicas das quais somos herdeiros. "Credo quia absurdum est". Alguém disse que a alma reage de três modos diferentes _matemática, música e mito. Se negligenciamos os mitos que falam verdades sobre nossa condição fazemos isso por nossa conta.
Dedicatória aos religiosos:
"Não existe ideais ou verdades absolutas e sim conflitos de interpretação "
(Nietzsche )
Karl E Scheibe
sexta-feira, 11 de agosto de 2017
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